Jornalismo ao pormenor

Ministro do interior pode estar envolvido em conflito de interesse num processo de importação de armas

CIP começa a revelar o outro lado dos eleitos de Chapo

São no total 50 armas importadas pela empresa Nello Gonçalves Filho Espingardaria e Carreira de Tiros, Limitada, ligada ao ministro do Interior, Paulo Chachine.

Uma publicação do Centro de Integridade Pública (CIP) de 23 de Fevereiro de 2025, revela que a Autoridade Tributária de Moçambique solicitou, através da nota no 381/AT/DGA-GDG/419/2024, de 20 de Setembro de 2024, ao Ministério do Interior o envio de técnicos para peritagem física de armas que reteve no Aeroporto de Mavalane. Acontece que a empresa importadora das armas tem como um dos seus accionistas o actual ministro do Interior. Agora, Paulo Chachine terá de enviar os seus subordinados para realizar a análise técnica para clarificar as especialidades das armas importadas pela sua empresa, num claro conflito de interesse nos termos do n.°1 do artigo 34 da Lei de Probidade Pública.

De acordo com este artigo, continua o CIP,  “ocorre conflito de interesses quando o servidor público se encontra em circunstâncias em que os seus interesses pessoais (…) possam interferir no cumprimento dos seus deveres de isenção e imparcialidade na prossecução do interesse público”.

Na terça-feira passada o Centro de Integridade Pública divulgou um estudo no qual alertava sobre a existência de alto risco de conflitos de interesse envolvendo alguns ministros do Governo de Daniel Chapo que têm empresas que actuam nas mesmas áreas para as foram nomeados (Leia o estudo aqui). Não passa ainda uma semana, já surgiu o primeiro exemplo flagrante envolvendo um sector sensível.

São no total 50 armas importadas pela empresa Nello Gonçalves Filho Espingardaria e Carreira de Tiros, Limitada, ligada ao ministro do Interior, Paulo Chachine.

A Autoridade Tributária suspeita que a empresa tenha feito uma falsa declaração de importação de armas de caça, quando se trata de armas de guerra.

Paulo Chachine criou a sociedade com o cidadão Pedro Manuel Prazeres Gonçalves, um mês após iniciar as funções de Comandante do Ramo do Exército das Forças Armadas de Defesa de Moçambique, a 12 de Março de 2021.

Empresa do ministro obteve garantia de exclusividade para a distribuição de armas de uma fabricante turca

Em carta de 14 de Agosto de 2023, a Sasa Defense Industry (empresa turca que se dedica ao fabrico e venda de armas e munições) autoriza a empresa Nello Gonçalves Filho Espingardaria e Carreira de Tiros, Limitada, a ser representante da Panzer Arms, sua subsidiária baseada na África do Sul. No mesmo documento a gigante turca autoriza a empresa do ministro a ser distribuidora exclusiva do seu armamento em Moçambique. Mas para tal impôs uma condição: que a empresa de Chachine adquira pelo menos 1000 armas à Panzer Arms entre 10 de Julho de 2023 e 10 de Julho de 2024. Não temos evidências de que a empresa tenha cumprido com a condição imposta para ser o distribuidor exclusivo de armamentos em Moçambique.

O documento ostenta um carimbo da empresa turca e detalha que as armas a serem adquiridas são as semiautomáticas (arma que realiza automaticamente todas as operações de funcionamento com excepção do disparo, o qual, para ocorrer, requer, a cada disparo, um novo accionamento do gatilho)1 e espingardas Pump (que são armas que funcionam por acção de telha (pumps) onde se manobra a “telha” que é uma peça de madeira de polímero ou de madeira para frente e para trás para se municiar a arma a cada novo disparo)2 . Estas armas estão inclusas no catálogo publicado anualmente em todo o mundo.

Primeiro desafio ao discurso de Daniel Chapo

CIP lembrou que  durante a sua investidura, o Presidente da República, Daniel Chapo, prometeu romper com velhas práticas nocivas na gestão da coisa pública e avisou que será implacável com más práticas dos servidores públicos. Nesse discurso, Chapo destacou que o seu executivo iria liderar pelo exemplo e promete medidas decisivas contra a corrupção, desorganização e falta de transparência no Aparelho do Estado. Alguns círculos de opinião consideraram o discurso muito próximo da linha Samoriana por isso esperançoso, principalmente num contexto de crise em que o país está mergulhado.

Entretanto, um outro grupo mais reticente recorreu aos exemplos do passado para recordar que Armando Guebuza e Filipe Nyusi também venderam promessas que nunca se efectivaram. Por isso, a sociedade espera para ver as acções concretas de Daniel Chapo após as promessas. Este é o primeiro caso de conflito de interesses que vai testar a seriedade do discurso do novo presidente.

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