Jornalismo ao pormenor

Identidade nos confins de Gaza em vias de extinção

Tal como o desporto, o consumismo, a novela entre outras diversões que abafam o desemprego, stress e a marginalidade nas ‘’grandes’’ cidades, a falta de transporte, hospitais, segurança entre outras misérias em Chimbembe, no interior de Gaza, é abafada pelo poder de som dos batuques de uma dança ‘’anónima’’ em vias de extinção.

Em Chimbembe, a sociedade, de maneira espontânea, ainda desfruta o fascínio do reluzir da lua e das grandes lareiras. Nessas noites, os jovens ainda se furtam beijos atrás da casa, ou nos caminhos estreitos. Deixemos pormenores, em Chimbembe, recomenda-se navegar ao som, quase divinal, de batuque.

Para ter uma ideia imagética sobre o que aqui se tenta trazer à lume, melhor é transcrever uma conversa não planeada com Sebastião Mbendane. A amonstra não é apenas do interior e confins de Gaza, nesses trechos ficam também decalcadas as linhas de uma dança do sul do país desconhecida por muitos – a dança Massesse.

 

– Mais de 70 anos de idade,  quando começa tocar ?

Eu toco Massesse desde muito tempo. Sempre minha actividade era principalmente tocar xingoname [variante de xigubu – batuque em língua changana ].

– O que é, concretamente, Massesse?

Massesse é uma dança tradicional, que existe desde o tempo dos nossos antepassados. Existe duas danças que custa dizer se são inteiramente diferentes ou é uma com duas ramificações: Muthimba e massesse. Muthimba canta-se nos casamentos enquanto Massesse é mais para receber visitas; cantamos também para divertir aqui na aldeia. Isso normalmente acontece entre 19 a 20h.

– Como aprendeu?

Eu aprendi com minha mãe. A minha mãe tocava e dançava na altura. Era a responsável da  Um aspecto importante: minha mãe aprendeu com a mãe, não sei onde e nem como minha avó aprendeu.

– Diz-se que o senhor é muito famoso até porque quando actua o público fica extremamente satisfeito.

(Risos). Eu canto sobre a terra. A independência. O governo. Ensino as pessoas a viver condignamente.

– Essas danças de algum modo contribuem para o desenvolvimento cultural das pessoas?

Sim. Muitas pessoas falam das minhas músicas, e acredito que de certo modo influencia para vida das pessoas. Não só nessa aldeia mas como também em aldeias vizinhas.

– Uma dança educativa?

Sim. Canto coisas que acontecem aqui em Chimbebe. A falta de energia bem como de água e estradas.

-Que dificuldade enfrenta, enquanto fazedor de cultura?

O problema é que não existe boa organização e outros grupos para dançar. Mas mesmo assim temos actuado e quando isso acontece as pessoas gostam e dizem: sim senhor, esses dançam como deve ser!

– Como é que o grupo sobrevive?

Dificilmente. Por exemplo. Quando o material está estragado dev

o comprar com dinheiro que tiro dos meus bolsos, o que é muito complicado uma vez que o que consigo nem para sustentar família basta.

Muitas vezes quando estamos a dançar algumas pessoas que nos assistem. Quando essas pessoas estão muito emocionadas tirão algum valor do bolso e deixam em pequenas peneiras ou nas nossas cabeças. Esse dinheiro muitas vezes usamos para comprar pelo de boi quando a pele dos nossos batuques se rasga. Não é grande coisa mas este interesse das pessoas nos motiva e nos satisfaz.

-Quantas pessoas compõem o vosso grupo?

20 Pessoas. Eu sou o líder desse grupo. No grupo cada pessoa tem tarefas específicas. E existem três responsáveis que me substituem enquanto toco batuques. São substitutos que orientam o resto do grupo.

– Como se dispõem durante o espectáculo?

Durante o nosso espectáculo entramos em exibição com três músicas, duas para dançar e a última para sair.

– Em termos de necessidade o que vos preocupa?

Nós precisamos de um uniforme para uma boa identificação nas actuações. Nas actuações as pessoas devem nos identificar a partir do uniforme, o que não acontece. Cada um dos elementos traja o que poder. Isso é muito triste para nós. De alguma forma não nos moraliza.

– O que significa Komo komo Nhathela, vosso slogan?

Não podemos ficar muito tempo numa actuação até tudo perder sentido. Tudo na vida deve ser feito com brevidade. Não é por se demorar tanto numa situação que se faz a coisa de forma eficiente. Komo komo Nhathela significa dançar e sair o mais rápido possível de modo a dar espaço a outros grupos.

– Quando estão em trabalho, como é que geralmente actuam?

(Risos e tosse longamente). Quanto chega nesses tempos a dançar pode mostrar. (Chama o neto, Vasco, que traz um batuque).

– Massesse é uma dança que exige muita força e resistência nos braços, isso a olhar pelos instrumentos e os passos no palco?

Sim. Sim. É uma dança de muita força. Dança-se em quatro a quatro pessoas.

 (Sebastião Mbendane faz uma demostração. O som, Os pássaros agitam-se nas árvores.Não é exagéro, é pura verdade. As crianças e os adultos nas suas casas sentem-se convidados a assistir. Pensam que Mbendane está para actuar. Apenas é uma de uma demonstração. Dança Massesse. Ainda por descobrir. No interior de Moçambique. Estamos em Chimbembe, aldeia do distrito de Guijá, Gaza. Em conversa  com um guru da dança tradicional.)

– Aqui em Chimbembe e olhando para seu talento, sente-se um peixe fora da água?

Em alguns aspectos me sinto insolado, principalmente no referente a apoio. Por exemplo, a nossa dança precisa de apitos mas nós não temos. Se tivéssemos quatro apitos estaríamos muito felizes. E depois é a situação de uniforme para os vinte elementos que compõem o grupo.

Outra situação se relaciona com falta de transporte que para além de preocupar para todos aqui na aldeia preocupa principalmente a nós uma vez que é difícil deslocar.

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