Chimbembe: onde o homem vive, o resto morre
De Chimbembe, em Guijá, Gaza, para Maxixe, capital da província, o percurso mais curto é de 160 quilómetros aproximadamente, os dados são de um condutor que nos acompanha. Para chegar à Chimbembe primeiro passa-se por Chokwé numa rota que dispõe somente um transporte de caixa aberta. Se não tem meios próprios, o que é um caso colectivo, perde transporte, perde a viagem.
Um pormenor: para entrar em Guijá passa-se primeiro de Chokwé. Mas isso é de menos. Vamos ao que interessa. Geograficamente, a sede da administração do distrito de Guijá fica na fronteira entre Guijá e Chokwé. Na prática, estamos a dizer que a sede de Guijá fica em Chokwé. Uma vergolha administrativa que tem consequência terrível para localidades e aldeias do distrito.
Estamos a dizer que estes para tratarem BI devem ir praticamente à Chokwé. Para tratarem assuntos de compra, educação entre outros, devem ir à Chokwé. Parece exagero. Mas é pura realidade. Esse romance triste, essa estória desgraçada, essa realidade obvia mas inacreditável não pára por aqui.
Chimbembe não têm escolas secundárias, mercado, esquadra. A tecnologia existente é extremamente deficiente. Do ponto de vista político, governamental e de bem-estar social a desorganização é demais, como as cenas dos filmes de faroeste.
E por falar em filme, longe de nos concentrar em política, questionamos como é que os aldeões sufocam a dor derivada da falta das condições básicas no contexto actual? Como é que relaxam ao anoitecer depois do trabalho, obviamente da agricultura? Por sorte, diferentemente das cidades, onde a luz das lâmpadas ofuscam o poder da natureza, em Chimbembe o reluzir da lua ainda faz sentido.
De dia, o calor ferve o sangue que circula nas veias. A sombra dos cajueiros é pacata para arrefer esse calor que sufoca a mente. jeleira? Não. Não há jeleira? Má notícia para quem gosta de cerveja. Deve deitar na língua como se fosse chá, o que não tem graça. Enfim, longe de publicitar a cerveja, o que queremos mesmo é pedir água na vizinhança. Uma família de 12 mulheres e 1 homem, o dono da casa, regressa da machamba.
Quem serve água é uma menina de 14 anos. Filha? Não. É nora da casa casada há dois anos. Escola? Nem pensar. Na aldeia o casamento significa também desistir da escola. O marido é um polígamo que, tal como muitos jovens da zona, trabalha nas minas de África do Sul. Em Chimbembe, assim como em muitas zonas onde os homens emigram para caçar melhores condições de vida, há mais raparigas que rapazes.
Nesse breve passeio, regressamos para casa do chefe da aldeia, um homem na tabela dos 70 anos, já rodado, come as frutas de uma mulher na tabela dos 20. Há muito de selvagem na natureza humana. Como é que aquilo pode ser possível? Essa pergunta pode ser ética; pode ser retórica. Mas também pode ser hipócrita. sim… pode ser.
Esses movimentos em defesa de mulher que andam encharcar nas capitais, principalmente em Maputo, que passam de arcondionado do escritório para o arcondicionado dos famosos FORD, deviam visitar Chimbembe. A descrição desta breve viagem termina de forma injusta. Por aqui. Talvez, até a próxima.